BENFICA E PORTO, OS ROSTOS DO SISTEMA*
(* Este texto foi publicado dois dias antes da decisão do Conselho de Justiça)
Sou sócio do Vitória de Setúbal (nº694) e do Sporting (nº19411) e já fui sócio do Benfica antes de ser sócio do Sporting. Não tenho, por isso, qualquer simpatia pelo Porto e por Pinto da Costa. No entanto, a luta de bastidores entre Benfica e Porto, à volta do processo Apito Dourado, é elucidativa da forma como estes dois clubes se assemelham nos métodos subterrâneos, desleais e sem olhar a meios que utilizam para atingir os seus fins. E todos nós já percebemos que o resultado deste jogo de secretaria vai ser decidido pela cor futebolística de quem tiver o poder de decidir e não pelas leis ou regulamentos. Aliás, a escandalosa decisão do Conselho de Justiça que absolveu Nuno Assis no caso do doping é esclarecedora de como a cor da camisola é decisiva.
E foi precisamente por me aperceber de que o Benfica era o rosto do sistema que, em 1985, deixei de ser sócio deste clube e me fiz sócio do Sporting. Com efeito, quando, num pequeno país como o nosso, um clube tem seis milhões de adeptos que querem ganhar nem que seja com um golo com a mão, se se confiar no sistema, a maioria dos lugares de decisão são ocupados naturalmente por este clube. Ora, isto desvirtua completamente qualquer competição. Basta, aliás, constatar como o país futebolístico aceitou com naturalidade que o presidente do Benfica combinasse com Valentim Loureiro o árbitro da final da Taça. É óbvio que tal facto não configura um ilícito penal, mas não pode deixar de configurar um ilícito disciplinar grave. Até porque quem tem o privilégio de escolher o árbitro não precisa de corromper o que lhe sai na rifa.
E a melhor prova do que é o sistema são as primeiras páginas dos jornais desportivos onde a verdade desportiva cede, sistematicamente, ao peso dos seis milhões de adeptos: ganhe quem ganhar, a primeira página tem de prestar sempre vassalagem ao Benfica. Ora, como pode haver, em Portugal, um campeonato isento se até os jornais desportivos estão impedidos de dar destaque aos vencedores sob pena de deixarem de ser viáveis economicamente?
Compreendo, por isso, perfeitamente a estratégia de Pinto da Costa de querer colocar adeptos seus em lugares chave, porque esta é, infelizmente, a única forma de se conseguir ganhar alguma coisa em Portugal. Aliás, o facto de Pinto da Costa ter necessitado de controlar os árbitros no ano em que o Porto foi campeão europeu é a melhor prova disso. O Porto, recordo, tinha, nesse ano, dos melhores jogadores da Europa (Vítor Baía, Paulo Ferreira, Ricardo Carvalho, Jorge Costa, Deco, Maniche, Costinha, McCarthy, Derlei, Alenichev, Carlos Alberto, etc.) e era treinado pelo melhor treinador do mundo: José Mourinho. Se com uma equipa destas e com este treinador, o Porto, para ganhar um campeonato de equipas medíocres, necessitou de controlar os árbitros, é porque, em Portugal, os jogos não se disputam nas quatro linhas, como agora, de resto, se está ver.
Para que o futebol português se regenere, só antevejo uma saída: a criação de dois campeonatos da I Liga, um disputado nos subterrâneos das secretarias pelo Benfica e Porto e outro disputado nos campos de futebol pelos restantes clubes.
Santana-Maia Leonardo : http://sol.sapo.pt/blogs/contracorrente
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